Mulheres recebem menos na maioria dos esportes
Neymar e Marta são exemplos emblemáticos da
discrepância, com salários anuais de US$ 14 milhões e US$ 400 mil,
respectivamente
Por Natália Mazotte
Além da baixa representatividade nas gerências das federações
esportivas, a carreira das atletas passa por obstáculos financeiros. O suor
para estar em competições nacionais e internacionais de alto nível é o mesmo
para homens e mulheres, mas não raramente as recompensas são menores para elas.
Veja também: Mulheres nos jogos: 120 anos depois
Em um caso que ganhou destaque recentemente, o time
brasileiro vencedor da Liga Mundial de vôlei feminino de 2016 levou pra casa um
cheque de 200 mil dólares, valor cinco vezes inferior ao recebido pelo primeiro
lugar da Liga Mundial masculina.
Em entrevista ao Gênero e Número, a oposta Sheilla
Castro, bicampeã olímpica e integrante da atual equipe de vôlei campeã, critica
a diferença entre as premiações. "Muito discrepantes os prêmios no
masculino e feminino. Nunca formalizamos nenhuma reclamação, mas já conversamos
com o Ary [Graça, atual presidente da Federação Internacional de Vôlei], quando
ele era presidente da CBV", disse a jogadora.
A diferença de remuneração é ainda mais notória quando
se olha para o prêmio em dinheiro oferecido pela FIFA, órgão de gestão do
futebol no mundo que apenas em 2013 teve a primeira mulher em seu comitê
executivo, a burundesa Lydia Nsekera. Enquanto a equipe feminina dos EUA ganhou
US$ 2 milhões da organização por vencer a Copa do Mundo do ano passado, a
seleção masculina alemã arrecadou US$ 35 milhões após ser campeã da Copa do
Mundo de 2014. Se o prêmio fosse dividido pelos jogadores em campo, a receita
das americanas não chegaria a US$ 200 mil por atleta, enquanto os alemães
embolsariam mais de US$3 milhões individualmente.
Sheilla afirma que a justificativa dada para a
disparidade é a diferença de patrocinadores, o que impactaria no valor que
entra. "Se é ou não verdade, eu não sei", disse.
As contas bancárias dos atletas refletem essa
diferença. Na última classificação divulgada pela Forbes, entre os cem atletas
mais bem pagos do mundo há apenas duas mulheres: as tenistas Serena Williams,
que recebe US$ 28,9 milhões, e Maria Sharapova, com US$ 21,9 milhões por ano,
respectivamente 40º e 88º no ranking. Valores altos, mas nem metade do que
recebe a estrela masculina do tênis Roger Federer, US$ 67 milhões.
Se no tênis, um dos esportes mais equânimes em termos
de gênero, onde todos os principais torneios oferecem prêmios idênticos nas disputas
femininas e masculinas, a diferença de salários e patrocínios dos primeiros do
ranking ainda é considerável, no futebol ela atinge seu ápice.
Neymar e Marta são dois expoentes dessa a paixão
nacional, e estão em campo na disputa pelo ouro olímpico. Ela já foi eleita
cinco vezes melhor jogadora do mundo pela Fifa e marcou 103 gols com a camisa
da seleção. Ele conquistou o terceiro lugar na última votação para melhor do
mundo, e chegou a 50 gols defendendo o Brasil. Mas é na conta bancária que a diferença
entre os dois se sobressai: Marta recebe de salário anual US$400 mil contra
US$14,5 milhões de Neymar, de acordo com a Forbes. Se fossem pagos por gols com
a camisa amarela, cada bola na rede da Marta valeria cerca de US$3,9 mil (cerca
de R$12,2 mil), enquanto a do Neymar valeria US$290 mil (cerca de R$905 mil).
Pode ser moralmente escandaloso que Marta receba tão
menos que Neymar? Em um mercado movido a patrocínios, tudo parece justificável.
As receitas patrocinadas da Copa do Mundo masculina chegaram a US$ 529 milhões.
No mundial feminino, US$ 17 milhões de investimentos privados.
Neymar |
Visibilidade e popularidade são palavras-chave para
entender por que os esportes femininos atraem menos patrocínios. "A mídia
dá pouca visibilidade às conquistas das mulheres, aos campeonatos das
mulheres", explica Silvana Goellner, professora da Escola de Educação
Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e especialista em questões
de gênero no esporte. "A mídia produz muito a representação do esporte
para os homens, então como vamos tê-las como inspiração?", questiona
Silvana.
Os acordos de transmissão e direitos televisivos
exercem uma poderosa influência nos negócios esportivos. A popularidade dos
jogos, com o comparecimento aos estádios para ver as equipes femininas, também
afeta diretamente a receita dos campeonatos e o interesse das emissoras. Quanto
menos são noticiadas e televisionadas, menos pessoas têm o interesse despertado
e as prestigiam. Quanto menos pessoas prestigiam as atletas, menos elas são
noticiadas e televisionadas. Um círculo vicioso que explica em grande parte a
batalha para equalizar economicamente as competições feminina e masculina.
Este
texto foi produzido pela web revista Gênero e Número, uma iniciativa de
jornalismo de dados que está sendo incubada pela Agência Pública em 2016. A
cada mês, ela tratá uma série de reportagens com um tema relevante sobre a
desigualdade de gêneros.
Natália Mazotte é jornalista e codiretora da Gênero e
Número
Colaborou Mariana Bastos
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