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A casa do cordel.


A Revista Instigada apresenta a história da literatura de cordel perante o olhar do poeta e cordelista Paiva Neves

Nos primórdios da literatura de cordel, a feira das pequenas vilas e povoados eram seu palco principal. Com o crescimento das cidades, a aculturação das populações, devido principalmente a enxurrada de novas informações que trouxe o advento da televisão, o cordel definhou e ficou quase impossível encontrar um clássico da literatura popular exposto para a venda.

No entanto, ele permaneceu enraizado e bem enraizado, na memória das pessoas. Quem não tem uma referência de vida ou uma lembrança da infância ligada a esta literatura?

Eu pessoalmente tenho várias. Lembro-me menino aos sábados, na feira de Cedro, disputando lugar com outros garotos em meio à multidão, para ouvir o folheteiro cantando os versos do poema que trazia na mala.

O ruim era que no melhor da estória, no ápice do enredo, ele parava a narração no intuito de vender os exemplares. Lembro-me também de uns parentes de minha mãe que moravam em Lavras da Mangabeira, onde fui passar umas férias. Lá na casa onde fiquei tinha uma mala recheada de folhetos.

Passei um mês inteiro lendo. Sem falar de uma tia que nas noites de lua cantava de memória para o nosso deleite, diversos romances. Foi pela boca dela que conheci João Grilo, Cancão de Fogo, O romance do pavão misterioso, João de Calais, Pedro Malazarte, entre outros.

Nos anos 90 o cordel volta à tona, só que para um público diferente. E nas universidades que reaparece com força total, são realizados inúmeros estudos, teses são construídas e muitas matérias na mídia são divulgadas. Surgem novas editoras reeditando clássicos, novos poetas despontam e um numero grande leitores buscam as estórias rimadas.

No entanto o velho e fiel público não toma notícia do seu ressurgimento. Para este público, o povo das feiras, das comunidades, o público pouco letrado, para este público o cordel desapareceu. Recentemente, expondo em uma feira uma banqueta com cordel fui tomado de surpresa com a aceitação por aquelas pessoa simples.

Ao verem os folhetos ficavam admiradas e falavam perplexas:" Olha, ainda existe romance"! Alguns mais desconfiados, já vão lendo para certificarrem-se da originalidade do texto.

Retornei outras vezes e a cada dia me surpreendo mais. Deparo-me com pessoas que guardam romances inteiros na memória. Para demonstrar que sabem ficam declamando.

Outras falam que na infância o pai lia para elas. Conheci uma senhora que tem mais de dois mil títulos, edição dos anos 60, que pertenceu ao pai. Essas pessoas sempre vão à feira passam na banca e compram cordel. A feira é a casa do cordel.

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