quarta-feira, 27 de agosto de 2014

RESENHA DO LIVRO - A CARNE - JÚLIO RIBEIRO


Por Vânia Oliveira

Em 1888, o naturalista Júlio Ribeiro choca a sociedade com a obra “A CARNE”. Romance naturalista que abordou temas até então ignorados pela literatura da época, como por exemplo, o amor livre, o divórcio, e a mulher inserida na sociedade em um novo papel, o que escandalizou as famílias tradicionais que proibiam suas jovens de ler a obra  muitos do que adquiriam-na pediam segredo sobre a aquisição da obra.

Mais que um mero escândalo sexual, o romance foi um dos livros mais discutidos e populares do país e embora sejam encontrados alguns exemplares antigos, estão mutilados, talvez por chocar de fato uma sociedade hipócrita que por décadas lhe aprisionou á margem da grande literatura que o compunha, pois a dita sociedade cegou e contaminou-se pelo obsceno do livro sem se dar conta (a meu ver) do ápice da história: surge na literatura a mulher independente em todos os sentidos.

O romance também foi um divisor de águas entre os leitores, ao passo que alguns o desdenhavam, outros o promoviam ao fazerem críticas exageradas em tom leviano. A obra então foi ganhando popularidade e até mesmo aqueles que a repudiavam liam as escondidas, intencionado ter acesso ao proibido que não lhes permitido.  

Foi o caso de tantas mulheres que sofreram julgamentos ferinos e até tiveram seus casamentos desfeitos por causa da leitura de “A CARNE”, temática que implícita manifestação sexual, sádica, ninfomaníaca, e pervertida de nudez e sexo. Foram vários os críticos que o vetaram, dentre eles cito o mais categórico 

Álvaro Lins que em 1941, o classificou como uma obra de “mediocridade intelectual”.
Na minha enorme curiosidade sobre a proibição da obra, EM 1994,procurei-a na Biblioteca Pública Municipal de Jaguaribe, e qual foi minha surpresa: 106 anos depois, eu já maior de idade embora facilmente confundida com uma adolescente por se tratar de alguém “pele e osso, FUI PROIBIDA DE LER A OBRA

Mas minha insistência convenceu à senhora responsável e passei a ler na biblioteca, pois não me permitiu emprestar. Descobri também através de relatos escondidos com amigos que num município pertinho de Jaguaribe (me proibiram de dar maiores esclarecimentos) um casal teria se divorciado porque a esposa leu a obra na época da sua edição. Por muitos e exclusivos motivos, embora já tivesse lidos centenas de outras tantas obras literárias, 

A Carne, não poderia deixar de ser por mim escolhida de fato e direito a obra inicial da PRATELEIRA DE LEITURA, por ser Lenita, uma mulher que foi além da miopia enferma da sociedade e apesar de mascarada pelo sexo, foi a importante heroína de um contexto social brasileiro e mundial.

RESENHA
O romance conta a história de Helena Matoso, carinhosamente chamada de Lenita, mulher extremamente culta e bela que perdeu a mãe no parto e aos 22 anos, após a morte do pai, foi morar numa fazenda do interior de São Paulo, na residência do coronel Barbosa, que também já havia criado seu pai. 

Lenita conhece os prazeres da carne nas mais diversas e sórdidas apresentações. Desde o cheiro de sangue do escravo açoitado e seus gritos de dor, a cópula de animais, dentre outras citadas no livro. 

Mas seu desejo carnal se concretiza ao conhecer Manuel Barbosa, filho do coronel, homem maduro, experiente e conhecedor da vida. Manuel vivia trancado em seu quarto em meio aos seus livros e periodicamente saia para longas caçadas. 

Viveu por dez anos na Europa onde foi casado com uma francesa, da qual se separa. Esse amor é marcado 
de encontros e desencontros, prazer e violência, desejo e sadismo, uma batalha entre corpo e mente.

No decorrer do mesmo, Lenita encontra cartas de outras mulheres guardadas por Manuel, o que leva a história a partir daí para um trágico desfecho. Lenita sentindo-se traída resolve abandoná-lo e grávida de três meses abandona-o e casa-se com outro homem.

Manuel não suportando, suicida-se, o que comprova o resultado final do duelo entre a carne e a mente. No início os prazeres da carne, no final os desenganos da mente.
Convido-os a ler a obra não de forma indigesta, como fizeram os críticos, pelo contrário, leia  A Carne bem temperada e  bem servida.

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